quinta-feira, 29 de outubro de 2009

357º Dia (parte III)

Nunca tive realmente um bom motivo para ler. Realmente, as fichas de leitura eram especialmente odiadas por mim. Porém, eu sempre li, não tenho motivos
Odeio o fato de entender as coisas só agora que eu não as tenho mais. Um livro seria suficiente. Eu fugiria desse quarto. Através dele eu poderia estar com outras pessoas, conversar com outras pessoas, botar a criatividade no mode on.
Porém eu não o tenho.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

357º Dia (parte II)

A televisão. Nunca pensei que sentiria falta dela. Pelos meus cálculos (eles talvez estejam um pouco errados), hoje é domingo.
A última coisa que eu penso em fazer em um domingo é ver televisão, definitivamente. Bem, aqui não tem televisão. Mas também não tem nada do que eu poderia fazer aos domingos.
Quer eu queira, ou não, é nessa porcaria que nos influencia que eu fico sabendo de tudo. Eu posso estar na internet durante horas, mas nem me preocupo de entrar em um site de notícias para saber o que está acontecendo pelo mundo, nem para ver a previsão do tempo.
E agora, eu aqui, nesse quarto, tenho nenhuma notícia sobre nada.
Nada.
Na verdade, é só dele que tenho notícias.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

357º Dia (parte I)

Hoje senti absurdamente falta de três coisas.

-De música;
-De televisão.
-De ler.

Procurei em cada milímetro do meu quarto por algo que emitisse música. Não importava qual música. Todas da minha mente eu já havia cantado, e as músicas sempre soam ridículas saindo da minha boca.
Música é algo tão belo que eu consigo estragar tão facilmente... Eu consigo estragar muita coisa, é inacreditável. Eu estrago com tudo que é alinhado, tornando-os totalmente irregulares.
Eu me surpreendo comigo mesma às vezes. E ao mesmo tempo, confio plenamente no meu ser.
Eu não me entendo.
Sou a garota que está trancada num quarto de ninguém. Alguma definição melhor?
Por favor.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

48º Dia

Paciência é uma virtude. Eu bem sei disso.
Poucos a possuem. Observei isso ao longo da minha curta vida.
Eu fui forçada a adquirir-la, mesmo não querendo. Eu não a quero.

SAIA DE MIM!! Eu não te quero! E não te mereço!

Eu já topei com várias pessoas até estacionar aqui
Te juro, algumas pessoas se apresentam com uma máscara. Essa máscara é tão perfeita que até tem defeitos. Só Deus sabe o que se passa na mente dessas pessoas.
Ao contrario desses, minha mente é um livro aberto.

Você é prova disso.

domingo, 4 de outubro de 2009

1º Dia

Não. Esse não é o meu primeiro dia n’O Quarto de Ninguém.
Pelo contrário. Eu não sei quantos dias estou aqui. Então resolvi recomeçar contagem.
Meu aniversário já deve ter passado. Mais não senti nenhuma mudança em mim.
Já me acostumei com a fome. Qual quer um se acostumaria. Se eu dormir, eu acordo sem fome. Se eu tentar sair pela janela ou porta, caio no preto o qual chamo carinhosamente de Nada, e volto ao mesmo quarto, sem fome.
Então passo a acreditar que todo dia é o mesmo dia aqui.
Não sei se quero saber por que estou neste lugar.


Alguém deve me odiar muito.
Mas tudo bem.


Quem quer que seja essa pessoa, eu também a odeio.

sábado, 3 de outubro de 2009

369º Dia

Pequenas manchas vermelhas se destacam no lençol branco. Será que sangue mancha? Quando eu voltar do nada, as marcas estarão lá ainda?
Foi um ato de desespero.
Foi um ato pensado, ao mesmo tempo. Há muitos dias estou pensando seriamente em algo que pudesse, talvez, me tirar do comum. E meu sangue derramado num quarto impecavelmente branco me pareceu extremamente convidativo.
Sangue me traz a humanidade das coisas. E eu me sinto nada humana aqui. Ver meu sangue escorrer de mim, sem eu impedir, e cair devagar em qualquer lugar, eu queria que voltasse à vida.
Mais não adiantou.
Não estou morta. Mais é assim que me sinto.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

342º Dia

Sempre me irritei com o barulho. Mais a falta dele também me irrita.
Para que me irritar?
Estou absolutamente sozinha aqui, com quem ou com o que eu poderia me irritar? Não vale a pena cuspir palavras estúpidas ao único travesseiro impecável e inocente.
Ao mesmo tudo é único e tudo é apenas mais uma coisa. Ainda não encontrei o sentido. Como encontrarei o sentido para o nada?
A cada dia, pelo menos, aprendo coisas. Aprendi o valor das palavras pela ausência delas. Elas vivem apenas na minha mente, ecoando tão rápido que às vezes sou obrigada a gritar “Calma! Eu não te acompanho”. E elas não me obedecem, simplesmente continuam a festejar sem dó, criando idéias impossíveis de serem executas, sendo que eu apenas tenho o nada.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

54º Dia

A criatividade é uma coisa que vem e vai. Como eu aqui nesse quarto. Só que eu vou e venho na mesma velocidade. Toda tentativa de fuga é constrangida, pois caio no nada e volto ao Quarto de Ninguém.
Ao contrário disso, minha criatividade mais vem do que vai. Eu fico abraçada aos meus joelhos gritando por ela, chamando-a desesperadamente. “Minha amiga criatividade? Onde tu estás?”. E ela cisma em se esconder nos cantos mais ocultos de algum lugar que desconheço. Procurei em todos os centímetros da minha mente e também do quarto.
Posso ser sincera?
Desisto. E o pior é que não posso nem desistir de tudo. Da vida, por exemplo. Se eu me jogar da janela, vou cair no nada e acordar novamente aqui.
Então, não tenho controle nem dos meus atos. Isso tudo é muito estranho. Mas o que posso fazer?

128º Dia

Já perdi a conta do tempo. Não sei mais que dia é. Sinceramente, hoje parece terça. Eu falaria que é terça, se ontem e antes de ontem também não parecessem terça-feira.
Hoje pensei seriamente sobre as cores. Parece ser exato o contraste de cores de onde vivo hoje em dia. O quarto é muito claro. Tudo é branco. A cama, os lençóis, o tapete, as janelas, a cortina, enfim, tudo. E se abro a porta caio no nada. O nada é escuro. É tudo preto, e preto é a mistura de todas as cores. Branco, o quarto, é a ausência da cor.
Eu existo, não vivo ou sobrevivo.
Existo entre o paradoxo das cores.
Existo. Apenas.